27 de mar. de 2011

Cartas de Navegação



Em uma antiga cidade costeira ao sul dos nossos domínios, o silêncio reinava naquela calma noite de verão, até que por um grito, ele foi rompido. Do alto da colina a noite foi perturbada por uma criança! o que poderia ser?

O quarto estava todo escuro, a criança estava escondida sob as cobertas, até que uma luz surgiu pelas frestas da porta, passos fizeram-se ouvir, e a maçaneta abriu-se seguida de uma voz familiar:

- Meu filho! O que foi?

Após um curto silêncio a voz tremula de medo saiu da boca da criança:

-Mãe ele vem me pegar, ele mãe o névoa vem atrás de mim!

-Meu filho não há nada atrás de você, o mar está calmo, não há neblina, todas as embarcações estão sob uma longa calmaria.

-Mas mãe, ele vem me pegar!

O medo estava visível no rosto da criança, seu coração estava disparado.

Sua mãe sentou-se ao seu lado na cama, e repousou a cabeça da criança em seu colo.

-Venha, vou te contar uma história...

***

Buenas,

Sou Jullianus o capitão, ou melhor, o ex-capitão do Aurora.

Recentemente, ouvi boatos sobre uma nova e magnífica ilha-continente a nordeste da ilha da montanha, batizado de “Ilhas da Última Parada”, formado por um imenso arquipélago e habitado por um povo exótico que, apesar de possuir asas, consideram-se humanos, o que parece ter algum fundamento, pois seriam senhores de uma civilização capaz de superar Dragão Anão. Curioso como resolvi enfunar velas rumo à estes mares até então desconhecidos.

E aqui estou preso no porto do desprazível e caído Baía Negra. Na falta de coisa melhor a fazer, redijo as anotações que, espero, transferirei posteriormente para meu diário de bordo e meus portulanos de navegação.

Primeiramente, cabe dizer que não consegui determinar exatamente a minha posição. Vim parar aqui graças a um repentino Nevoeiro que o prisioneiro da cela ao lado chama de Manto da Morte. Parece que este fenómeno não é de todo incomum por estes lados. Entretanto, é certo que estamos mais ou menos próximos do que uma vez foi um vasto reino pirata, agora supostamente governado por estes idiotas da Baía Negra. Mas, como a desgraça nunca vem sozinha, o nevoeiro foi apenas o complemento de uma sucessão de insucessos e surgiu após a calmaria que se seguiu a tempestade. Esta sim é que foi terrível. Mesmo um velho lobo-do-mar como eu, fiquei profundamente nauseado ao ser jogado de um lado para outro como um brinquedo do “Grande Ranus”.


Em meio aos terríveis vagalhões que varriam os conves do Aurora e ameaçavam partir seu casco de um lado a outro como uma noz, Jonas começou a berrar desesperado, tentando chamar minha atenção. O que não é muito raro, uma vez que ele vive se metendo em encrencas, das quais, para se livrar, invariavelmente necessita de meu socorro. Entretanto, a súbita sobriedade de sua voz fez. Com que conseguisse o que queria: qualquer coisa capaz de fazê-lo sair de seu permanente estado de bebedeira seria suficiente para desviar minha atenção do timão, mesmo em meio aquele inferno de ondas, raios e ventos inclementes.

Sobre a crista de um imenso vagalhão, oscilava terrível o maior navio que já vi. Maior que a maior das quadri-remes, seus mastros pareciam tocar o céu. As armas a bordo me fizeram sentir saudades da armada do Púrpura. Parecia ter sido feito por gigantes, e se isso não bastasse, era negro. Completamente negro como a cabeleira de Notty e totalmente construído de ossos!

Isso mesmo, podem me chamar de louco, mas ao invés de pranchas de madeira, seus cascos eram feitos de chapas de ossos imensas como o escudo de um titã e mesmo assim flutuava como um ramo de junco! Suas bandeiras eram esfarrapadas como o manto da morte e para meu espanto era evidente que nunca em meus anos de pirataria tinha visto algo como isso. Tá, devo concordar que já ouvi falar sobre um tal navio de velas vermelhas, mas nada se compara a isso, um navio feito totalmente de ossos humanos. Logo cheguei à conclusão que um navio tão incrível haveria de ter um capitão ainda mais incrível no timão, e lá estava ele, um homem de mais ou menos dois metros de altura portando uma armadura vermelha como fogo.

Não gostaria de enfrentar este navio em combate, que para o meu espanto era o que ia acontecer, pois aquela horrível monstruosidade estava vindo em meu encontro. Com um descuido meu, nossos navios se emparelharam. Ferro e pólvora voaram em todas as direções, os canhões cantavam matando e destruindo tudo. Foi quando meu sangue gelou ao ouvir a ordem de abordagem, quando dei por mim estava um caos em meu navio com os marujos lutando pelas suas vidas. Até que durante uma épica batalha contra o desprezível capitão, desmaiei.

Quando acordei meus homens estavam enfileirados um ao lado do outro, num convés feito totalmente de ossos humanos que era duas ou três vazes maior que o meu convés, quando da cabine do capitão, um homem de trajes vermelhos com detalhes em dourado, veio em nossa direção. Não era possível eu o havia matado, ele parou em minha frente e me disse que poucos o haviam desafiado em combate direto, e também completou que poucos sobreviveram com o corpo intacto, me perguntou se eu sabia algo sobre um navio de velas vermelhas, perguntou se eu o havia visto. Logo sem pensar duas vazes, respondi que o navio que ele procura se chama Púrpura, e não, não sabia de mais nada á respeito. Então ele se dirigiu a minha tripulação, ou melhor, em direção ao que sobrou da minha tripulação, porque enquanto conversávamos seus imediatos retiravam os ossos deles vivos, e por incrível que pareça eles ainda se mexiam, eu clamei para que ele tirasse suas vidas, pois eles estavam sofrendo muito. Então ele disse que isto ia acabar bem rápido.

Ele apontou a mão para eles, uma força sombria e maléfica que eu não soube explicar, sucumbiu-os, tornando-os mais poderosos, uma sombra rubra negra os envolvia criando uma espécie de couraça. Logo fui recolocado em meu navio e por incrível que pareça, estava vivo. A Névoa rumou em direção ao porto pirata desaparecendo em uma neblina espessa. Logo após a neblina acabou, e não mais havia sinal de navio, apenas alguns de meus homens estavam na água. Agora só peço aos deuses do mar que nunca mais em minha vida coloque aquele navio amaldiçoado de volta em meu caminho.

Douglas "Duque" Lomar.

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